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Agueiro

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Nunca soube responder com exactidão à pergunta. “Afinal há quantos anos fazes bodyboard?” Lá por casa, guardo a primeira prancha que tive – uma luxuosa Easyrider que hoje me fica bem abaixo da cintura – assim como guardo a segunda: uma Mach 7-x, já bem usada quando a comprei por 15 contos. Sim, comecei a fazer bodyboard bem antes da época do Euro, bem antes dos modelos de prancha carregados de upgrades inúteis. Comecei a fazer bodyboard no liceu, quando o Tâmega já era tão odiado como temido pelos ‘kings of cool’ australianos e quando o Mike Stewart, naturalmente já venerado, ainda era candidato a mais títulos mundiais. Assisti ao desporto conquistar o seu espaço – alguém se lembra de ver Bodyboard na brasileira Fluir? – de ver nascer a Bodyboard Portugal, que depois foi BB Portugal e Vertical e, finalmente, Vert. Lembro-me de ver no Rodrigo Bessone e no Paulo Costa os maiores do desporto, lembro-me dos primeiros brilharetes em Pipeline e de ver a Dora Gomes como rainha. Também vi a Rita Pires e a Catarina Sousa a chegarem e conquistarem o trono naquele que terá sido, os senhores que me desculpem, o melhor duelo da história do Bodyboard nacional. Não, não sou velho o suficiente para estar senil e me ter esquecido do delicioso Hugo Pinheiro Vs Manuel Centeno, mas esses ainda não enterram o (saudável) machado de guerra e continuam a ser – digo-vos eu que levo muitos anos disto – os melhores dos nossos.

Continuo sem saber a resposta exacta, mas sei o que sempre respondi quando alguém me perguntava pelo bronze a meio do inverno ou pelas noitadas canceladas pela necessidade de acordar cedo ao Sábado – “Não faço surf, faço bodyboard”. Também houve alturas em que ia avisando: cuidado que o Bodyboard está a crescer, já andam mais que os rapazes do surf, cá em Portugal somos mais e melhores que os surfistas. Hoje, tristemente, mudou tudo. A resposta certa andará entre os 15 e (tragicamente) os 20 anos de esponjinha na água, com exactidão apenas posso dizer que são temporadas suficientes para ter visto o desporto ganhar espaço, quase abandonar o estatuto de ‘marginal’, quase a chegar a profissional e, subitamente, a estagnar.

Fomos notícia esta semana. Dentro ou fora de água, seja a acertar tubos inacreditáveis na esquerda mais mediática do país ou a puxar pela indústria nacional, um dos nossos melhores bodyboarders acertou uma manobra bem no ‘lip’ do campeão do Mundo de surf que, em praia alheia, chegou, dropinou e ainda se iludiu ao achar que podia gozar com quem tinha perdido a onda. Foi falta de informação. Alguém devia ter informado a estrelinha que por ali há uma trupe local que não é propriamente conhecida por ser hospitaleira. Teve sorte. Não sendo local, nem amigo dos ditos, conheço-os o suficiente para saber quem são e poder dizer que Parkinson teve sorte. É certo que dropinou um dos senhores do pico, mas nem de perto nem de longe, dropou o mais agressivo e eu, sem esforço, consigo imaginar dois ou três que não teriam sido tão meigos na resposta ao roubo. Por pontos que, sejam lá quantos forem, já levo anos suficientes disto para saber que o tema é sensível. 1, não sou local de lado nenhum por opção; 2, não acho que a violência seja solução; 3, respeito para ser respeitado em qualquer praia onde vá; 4, não sou por norma dropinado, não que acerte ARS monstros, mas porque as horas no lineup me ensinaram que respeitando se é respeitado. Certo é que esta semana o Bodyboard conseguiu o que raramente consegue – ser notícia, ser falado e comentado por quem acha que fala de um desporto de meninos. No limite, esta semana, o desporto foi comentado por quem o pode tornar verdadeiramente viável – o público mainstream.

Mas não foi o, bem dado, açoite ao Parkinson que me trouxe aqui. Foi o Saca, o Vasco Ribeiro, o Frederico Morais, um puto que, confesso, nem sabia que existia – Francisco Alves – e o monstruoso circo que por estes dias anda pela praia a que gosto de chamar ‘casa’. Vi o Mundial de surf explodir, tornar-se num enorme circo de vaidades, com artistas pagos a autocolantes, vi o nível bípede na água disparar. Era eu puto e o desporto dos ‘maus’ era chato, limitavam-se a subir e descer na parede das ondas, regozijavam com a água levantada e tratavam cada tubo como se fosse único. Um tédio para quem via o Eppo voar, o GT completar drops impossíveis ou o Stewart dormir dentro de tubos – não falo do Ben Severson para não me encaixotarem no departamento dos jurássicos. Hoje tudo mudou. Os bípedes surfam ondas tão quadradas como as de Mitch Rawlins, voam tão alto como o Hubbard e surfam tão bonito como o Ben Player. Pior, conseguiram chegar aqui de forma a poderem oferecer aos seus atletas as condições para que aprimorem a sua arte. Nós? As últimas notícia que tivemos da Austrália foram que o Damian King se tinha transformado em agente imobiliário e que o Ryan Hardy tinha aberto uma escola. E se isto não é pecado, não sei o que será.

Por cá, continuamos entre os melhores do Mundo. Basta ver a qualidade dos filmes produzidos, as ondas que Pinheiro, Centeno ou o Faustino continuam a surfar ou a quantidade de malta que todos os fins-de-semana chegam de pés-de-pato ao pico. Mas sempre fomos demasiado pequenos para ter um mercado capaz de sustentar um desporto que se quer global e nunca fomos capazes de contrariar os disparates que se vão fazendo. Da mesma forma que nenhum português podia ter impedido o Tom Morey de vender as pranchas à Matell, convenhamos que dificilmente algum poderia tomar de assalto a IBA, essa criminosa organização incapaz de reunir patrocinadores para a etapa de Pipeline, definir as etapas de um mundial ou, sequer, manter um site minimamente actualizado.

De repente, vejo que o Surf tem uma trupezinha capaz de, por cá, mudar a cara do desporto. Onde andou o Saca, podem chegar o Vasco, o Francisco e o Frederico. Com sorte, ainda lá pode chegar o semi-tuga Von Rupp. E nós? Os nossos não só deixaram de ter condições para aprimorarem a sua arte como deixaram de ter uma meta a atingir. Para quê torrar fortunas na qualificação para um Mundial que ninguém vê? Se no free surf mantemos a forma, na competição dificilmente o campeonato nacional que, por milagre, alguns casmurros insistem em conseguir montar fará a diferença. O desporto está, na melhor das hipóteses, estagnado, parado num perigoso agueiro que ameaça tornar o Bodyboard, que já foi o desporto de ondas mais progressivo do Mundo, num entediante exercício de rever manobras e estilos surf há muito conhecidos. Estou velho e pessimista? A ver mal e a falhar na análise? Espero que sim. Mas façam um exercício. Vejam um vídeo do Saca no primeiro ano de tour e agora um do Frederico Morais. Vejam o delicioso resumo da etapa no Fronton em 2011 – aquela que acabou com o Pierre a celebrar o caneco – e tentem ver qualquer uma das etapas deste mundial. Quem evoluiu? De portugueses não há sinal e os candidatos são três campeões do Mundo. Coincidência ou consequência de um desporto se deixou apanhar por um agueiro que impede gente nova de chegar ao pico?


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